segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

O codinome da morte

"Sete", este é o nome da primeira peça da dramaturga Dione Carlos, o tal número cabalístico que, por si só, já chama a atenção, aguça a curiosidade, mas que é só o começo da viagem. Daí vem o texto. O bom fruto de sua vivência estudando a "dramaturgia do transumano" de Roberto Alvim, que sabiamente deu palco a ela no Club Noir.

Dione problematiza o sujeito. Não há personagens, mas há muitos ao mesmo tempo. O general e o médico do agora tomam o lugar da mãe e a professora da memória. São tantos e também um só, um único indivíduo que muda de cara dependendo de sua posição na órbita, da distância que está em relação ao sol, explicaria a autora.

Também não há narrativa linear, mas fragmentos de experiências humanas numa guerra. No caos artisticamente organizado que criou para si, e para todos, a autora encontra a sua voz, enquanto nós, espectadores, nos enxergamos ali, no palco, vivendo uma trajetória universal. O espetáculo conversa com cada um de nós porque conversa com toda a humanidade - a sensação de que "isso tem a ver comigo" é atualizada a cada cena, a cada fala, a cada intervenção. E nosso cérebro, coitado, tão acostumado a começos, meios e fins, fica prazerosamente clamando por satisfação, uma dor desconhecida que se mistura ao gozo.

Ah, sim. A história? Você quer saber qual é a história. Bom, não sou eu que vou contar. Responder a esta pergunta seria destruir a dramaturgia e o olhar de cada um sobre ela. É como inferir num paladar que não é meu. "Sete" é uma obra aberta num sistema fechado, redondo. Para cada pessoa, bate diferente, pega de um jeito. É peça para ir lá e se servir.

Daria pra dizer que é sobre uma mulher (Sete?) num contexto de guerra, da opressão do homem sobre o homem, dos vários lados que existem numa situação limite. Porém, esta conclusão (uma entre várias possíveis) reduziria a proposta a muito menos do que ela é. Estou falando de um texto construído a partir de metáforas que proporcionam a ampliação da experiência, uma vez que esta guerra tanto poderia ser real quanto estar dentro de nós.

O texto ganha potência na direção da atriz Juliana Galdino, que, como sempre, extraiu o melhor do elenco formado na Paralela Noir, a oficina de atuação da casa. Mais uma vez, os atores e atrizes apresentam a mesma força em sua interpretação. Diferente da maioria das peças em cartaz em São Paulo, ninguém fica perdido em cena sem saber o que dar nem o que fazer. E a luz - que no Noir é tão importante quanto texto, direção e atuação - é bonita e surpreende.

"Sete" deve voltar logo mais.  A reestreia está prevista para o dia 12 de janeiro. É bom acompanhar lá no site (www.ciaclubnoir.com.br) e não deixar de ir.


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